Entrevista: Laís Fonseca explica sobre testes de equivalência e bioequivalência

A coordenadora do Serviço de Equivalência e Farmacocinética, ligado à Vice-presidência de Produção e Inovação em Saúde da Fiocruz, Laís Fonseca*, explica nesta entrevista a importância do serviço prestado pelo laboratório, sobretudo no que se refere à bioequivalência, que envolve um maior investimento em tecnologia.

“ O serviço que a gente presta está vinculado à Política Nacional de Medicamentos, que ajuda a fortalecer o cenário nacional de compromisso com o acesso da população aos medicamentos e a fabricação de genéricos, que precisam passar por esses ensaios.”
Em que momentos os testes de equivalência e bioequivalência são requeridos?

Os dois testes são requeridos na hora em que um medicamento é submetido ao registro ou renovação de registro na Anvisa. Qualquer medicamento hoje, genérico ou similar, para obter o registro aprovado na Anvisa tem que apresentar os ensaios de equivalência farmacêutica e de bioequivalência.

O que são testes de Equivalência Farmacêutica e Bioequivalência?

O primeiro dos testes realizado pelo Sefar, o de equivalência farmacêutica, é referente à avaliação físico-química dos medicamentos. Alguns aparelhos específicos testam os remédios já prontos – cápsulas, xaropes, pomadas - sob determinadas condições de pressão e temperatura, e verificam se o produto se mantém em sua apresentação ideal. Ou seja, se permanece firme, se não se dissolve em líquido, se não derrete etc. O segundo teste é o de bioequivalência, e se refere ao processo de comparação entre dois medicamentos que possuem as mesmas moléculas, nas mesmas concentrações e formas farmacêuticas, com o intuito de avaliar as concentrações plasmáticas dos mesmos no organismo humano, para o estabelecimento de sua intercambialidade.

Os estudos de bioequivalência são realizados em três etapas: a clínica, a analítica e a estatística. Para a etapa clínica, o Sefar subcontrata centros específicos, onde profissionais de saúde administram o medicamento em pessoas saudáveis, internadas e monitoradas em salas hospitalares durante 24 horas, e vão retirando amostras de sangue em tempos pré-determinados. Para isso são recrutados voluntários, nos centros com os quais o Sefar tem parcerias, especialmente em São Paulo. Recolhidas as amostras de sangue, as máquinas do Sefar começam a fazer os testes. “Verificamos assim a curva de concentração plasmática e a área sob a curva, e comparamos as curvas do medicamento em teste e do medicamento de referência. Se o grau for entre 80% e 120% da concentração do medicamento de referência, então está adequado. Depois desse momento fazemos um relatório e enviamos ao contratante com os cromatogramas de concentração plasmática, somado ao trabalho estatístico, que também subcontratamos. Com isso, o patrocinador obtém na Anvisa o registro e a empresa pode comercializar”, explica o analista de gestão do Sefar, Renato Dominguez.

Apenas os medicamentos produzidos no Brasil ou aqueles que serão comercializados aqui?

Todos os que que serão comercializados, pois, para isso, precisam do registro da Anvisa, mesmo que sejam medicamentos importados.

No Brasil, os testes de equivalência e bioequivalência podem ser realizados por quem?

Por laboratórios habilitados pela Anvisa para realizar este tipo de serviço. Os laboratórios de equivalência existem em quantidade maior. Há laboratórios públicos, vinculados às universidades e centros de pesquisas públicos, e também os laboratórios privados. Já quanto aos de bioequivalência, só há cinco públicos: o Sefar, um vinculado à Universidade Federal do Ceará, outro à Universidade Federal de Pernambuco, o quarto associado à Universidade Federal de Minas Gerais, e um vinculado à Universidade Federal de São Paulo. Todos os demais são privados.

Quanto esses testes custam para a rede pública?

Isso varia muito de medicamento para medicamento e da complexidade da análise. Se é um medicamento com um fármaco, se são dois fármacos no mesmo produto...

Por exemplo?

Para um medicamento comum usado para diabetes, o ensaio de equivalência custaria na faixa de uns R$12 mil, pois são só testes físico-químicos. Já os de bioequivalência sairiam na faixa de uns R$250 mil, porque aí você envolve voluntários na etapa clínica, precisa alugar uma ala de hospital para fazer a internação deles e realizar os testes. Os valores não são diferentes para uma empresa pública ou privada, porque trabalhamos sobre o nosso orçamento de pesquisa.

Quanto tempo é necessário para a realização dos testes, entre a solicitação e o fim dos testes?

Geralmente, um mês para a equivalência, e depois seis meses para a bioequivalência. Este é o tempo médio. Se o medicamente tiver vários princípios ativos dentro dele, aí o ensaio pode ser mais demorado.

Sobre o espectrômetro de massas, que propriedades fazem dele um equipamento especial?

Em relação aos outros equipamentos, ele tem uma sensibilidade muito maior. Hoje em dia toda a parte dos imunobiológicos, os biotecnológicos e os biofármacos, por exemplo, são analisáveis em equipamentos que têm sensibilidade para detectar este tipo de medicamento, o que os cromatógrafos convencionais, com detector de UV, não têm. Os equipamentos mais novos que recebemos no Sefar pegam fentogramas, parte muito ínfima, então se tiver aquela substância no organismo, mesmo que numa quantidade muito pequena, a gente capta. Aqui fazemos análise de plasma e de sangue total, mas já fizemos análise de urina, e podemos analisar outras secreções do organismo pelas quais o medicamento possa ser excretado. A vantagem disso é, por exemplo, quando a gente trabalha com hormônios (por exemplo, os anticoncepcionais), que têm dosagens muito pequenas, e geralmente são da ordem de microgramas ingeridos oralmente, e isso na circulação é uma quantidade muito pequena, e os equipamentos são capazes de detectar.

Qual o custo do equipamento em média?

Em torno de R$ 1 milhão cada um.

Qual a importância do Sefar no que concerne à população?

O serviço que a gente presta está vinculado à Política Nacional de Medicamentos, que ajuda a fortalecer o cenário nacional de compromisso com o acesso da população aos medicamentos e a fabricação de genéricos, que precisam passar por esses ensaios. Realizamos muitos ensaios aqui dentro para os laboratórios farmacêuticos oficiais – antirretrovirais, antituberculostáticos, antimaláricos. Temos grande experiência com todos esses medicamentos, que muitos centros não têm, justamente porque trabalhamos com esses laboratórios que atendem às demandas do SUS.

No contexto Fiocruz, temos prestado muitos serviços de farmacocinética para alguns projetos de moléculas novas, de fármacos novos que ainda estão sendo testados para virarem medicamentos. Temos participado bastante desses projetos de pesquisa com novos fármacos, através de estudos em animais, sobretudo ratos e agora macacos. Muitos projetos são fármacos que já estão patenteados tanto no Brasil quanto no exterior, e já têm resultados bem promissores, com interesse apontado por algumas empresas multinacionais..

Fale sobre as expectativas para os próximos anos.

Queremos aumentar o nosso escopo de atividades. Queremos ampliar nosso trabalho nesta questão de experimentação animal, que é uma área um pouco diferenciada, assim como a parte de investigação da atividade de metabólitos. Muitas vezes, ao administrar um fármaco, percebemos que não é aquela molécula que faz a ação. Ela é metabolizada, se transforma numa outra molécula, o metabólito, e, às vezes, é esse metabólito que tem atividade. Estamos nos especializando cada vez mais em identificar isso.

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